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A alcoólatra ninfomaníaca

A filha da puta bebia, mas bebia muito mais que muito marmanjo que conheço. Mais que eu? Com certeza, muito mais. Era um absurdo. Ela bebia mais que um Chevrolet Opala 6C, pelo menos, mais que a fama dele. Não que aguentasse a pancada, mas o tanque dela enchia que só. Quanto mais entrava, mais ela pensava que poderia entrar.

 

No começo, isso não me pareceu um problema. Rita, bêbada, tinha um tesão absurdo. Queria foder toda hora. Olhava-me e via uma máquina de sexo. Sentia-me um ator pornô, mas que também ouviria algumas palavras doces, que iria ao cinema e sairia pra jantar, de vez em quando. Entre alguns intervalos de sexo, rolava um pouco de conversa. Na verdade, conversa demais até. Ela não sabia, penso eu, apreciar o silêncio. Queria falar de tudo, a todo instante, mesmo sem ter o que falar a respeito. Eu gostava, também disso, a princípio.

 

Sociável, como a maior parte dos bêbados tendem a ser, ela fazia amizade com facilidade. Com meus amigos, parecia que eu era o estranho no cenário e ela é quem não os via há tempos. Tornava-se parceira, amiga, já queria agendar novos passeios... Eu gostava. Achava que tinha dado uma sorte absurda. Enfim, sua loucura era resumida a uma compulsão por duas coisas apenas: álcool e sexo, não necessariamente nessa ordem. Como eu gosto das duas coisas, tinha dado sorte, mesmo!

 

Cada episódio, uma aventura mais absurda que a outra. Metemo-nos em festa de gringo que faz turismo em favela de morro e acha que pobreza é cultura ou safári; varamos várias noites, completamente loucos, entorpecidos, apenas bebendo e transando em alto e bom som pra qualquer vizinho escutar; perdíamos a noção de qualquer pudor e quase fodíamos no meio de uma dança em um bar ou boate qualquer; embriagados e fumando maconha, fugíamos de blitz policiais jogando o carro em vielas apagadas próximas a bocadas e prostíbulos; deixamos porta de quarto aberta, dormindo nus, após horas de álcool e sexo, com direito a sermos vistos por seu irmão... Enfim, tudo do mais errado que poderíamos fazer, fazíamos. E não víamos, nisso, nenhum problema. Apesar de tudo. Dois inconsequentes no auge de sua excitação. Experimentávamos de tudo que nos desse vontade. No sexo, nas bebidas, nos locais, nas comidas, nas viagens.

 

Mas isso começou a me cansar. Comecei a ver naquilo uma idiotice sem tamanho e uma falta de propósito maior ainda. Não, não que tudo tivesse de ser correto, pelo contrário. Sempre gostei de andar um pouco errado. As regras não foram feitas pra mim, mas o extremo oposto também não. Em mim, há algo de velho, há algo de cansado, há algo de preguiçoso sobre a aventura como rotina. Aliás, todo tipo de rotina sempre me cansou, sempre me massacrou. Mesmo que a rotina fosse a loucura e a loucura fosse crescente. Eu me canso e, quando eu me canso, não há como recuperar fôlego. Eu me fodo e deixo morrer.

 

Até que, certa noite, após longa viagem pra estarmos juntos, Rita resolveu marcar um encontro com seus amigos. “Ok!, vamos lá!”, disse eu. Eu não sabia o que estava dizendo. Pensava que teria, assim, feito com que ela sossegasse o facho, que com suas amigas idiotas se distrairia o bastante pra que depois, somente nós dois, eu fosse ter um pouco mais de tranquilidade. Veríamos algum filme qualquer e dormiríamos preguiçosos, até à manhã seguinte. Ledo engano. E, quando Deus castiga, ele castiga feio! Mesmo que você sequer acredite nele. Talvez, até por isso, o castigo seja maior ainda.

 

Chegamos à casa de suas amigas. Um apartamento grande. Tudo parecia em paz, sossegado. Um almoço nos esperava. Coisa fina. Macarrão ao molho pesto, com direito a vinho de acompanhamento ou cerveja gelada pra quem preferisse, refrigerante, sucos e água. Opções não faltavam. Tudo parecia ir muito bem, melhor que o esperado, sem dúvidas. A princípio, o papo era agradável. Falava-se de frivolidades, coisas do dia a dia, qualquer besteira que garantisse algumas risadas e algum clima amistoso, evitando o constrangedor silêncio entre um desconhecido, no caso eu, e amigos que têm como afinidades apenas alguns gostos e nada mais.

 

Conversa vai, conversa vem, e eis que alguém sugere que os jogos comecem, ou, melhor dizendo, o castigo. A ideia era uma sessão de Sex And The City até o esgotamento de todo um DVD. Meu deus! Quem foi que matei pra passar por isso? A louca já me havia feito assistir a uns 2 ou 3 episódios anteriormente. Fiz o papel de bom namorado e assisti a tudo, quieto. Ri em duas ou três cenas e achei aquilo tudo muito melodramático e vazio. De um mau gosto absurdo. Um humor sexista e limitado demais que pra mim, assistir a uma roda de patricinhas discutindo homens seria, talvez, mais interessantes, afinal de contas, não era algo ensaiado, filmado e sequer eram consagradas por fazer coisa tão banal. Resumo, ela e suas amigas resolveram, com o apoio de um dos caras presentes, inserir o maldito disco no aparelho pra iniciar a sessão. Fodeu.

 

Me levantei, fui até à cozinha e saquei de lá mais uma garrafa de cerveja. Eu estava determinado: ficaria bêbado o bastante até apagar e não ver mais nada daquela besteira na tela. Já havia tomado vinho, mas como comi muito (aquela macarrão estava bom pra porra), o estômago retardou o efeito do álcool. Logo, tive de beber mais do que previ. Foram várias garrafas seguidas. Essas garrafas long neck são uma coisa do inferno. Você bebe como água e não percebe se já exagerou ou não. Continuei bebendo até capotar. Havia uma rede ali, no meio da sala, dessas redes típicas de casa de praia. Deitei na bendita e deixei o álcool me ninar.

 

Estava quente. Não demorou muito pra eu sair de sintonia. De repente, uma delas estava em cima de mim. Caramba! Enfim, a coisa estava ficando boa! Ela tinha cabelos longos, pretos, a pele bastante clara, os olhos bastante escuros. Meu deus, onde estaria Rita a essa hora? A garota subiu na rede e começou a me beijar. Eu suava em bicas. Como estava deitado e não conseguia sequer me mexer, não reagia. Mas estava difícil. De repente, ouvi a voz de Rita. Ela estava junto das outras amigas. Elas me olhavam e ela falava, como sempre, demais. Mas não parecia brava ou irritada. Então, resolvi ceder e comecei a beijar a garota. Sequer fazia ideia de quem era essa garota. Ela não estava ali quando chegamos. Aliás, o lugar todo parecia diferente de quando havíamos chegado. Estava tudo um pouco embaçado. Minha visão estava. Mas foda-se. Havia uma beldade me beijando, me imobilizando com carícias e com seu peso sobre meu corpo, e Rita parecia gostar daquilo. Então, a voz de Rita ficou mais forte, mais alta. E aquilo começou a me incomodar. Ela gritava, ria, e eu não entendia nada do que dizia.

 

De repente, acordei. Acordei, na verdade, horas depois. Minhas mãos estavam enroscadas na rede e haviam desligado o ventilador. Isso explicava minha imobilização e o calor. Um barulho infernal vinha da cozinha. Não havia garota nenhuma e a noite não seria mesmo boa, isso era uma previsão. Por isso, nunca gostei de sonhar: ao fim dos sonhos, fica a frustração e nada mais. Enfim, as meninas eufóricas conversavam em volume irritantemente alto e o disco estava em pausa, mas a tevê permanecia ligada, inútil. Levantei-me, elas planejavam fazer drinks. Queriam tomar tal Cosmopolitan. Eu jamais tinha ouvido falar nisso. Pra mim, drinks eram Cuba Libre, caipirinha e só. Meu negócio com as bebidas são as cervejas, alguns vinhos e algo com uísque ou vodca. Mas drinks, não, drinks não são minha praia. Pra piorar, depois de um tempo descobri que elas só queriam tomar essa porcaria, pois a personagem central desse seriado odioso toma essa porcaria de bebida. Fato é que faltava um ingrediente essencial do drink, um licor, e resolvi que eu mesmo buscaria pra elas. Era minha fuga, uma brecha pra isso. Precisava de um álibi pra escapar daquele inferno barulhento de vozes agudas e eufóricas e consegui, graças a elas mesmas. Dei uma volta pelo quarteirão, comprei a porcaria do licor, gastei do meu dinheiro e voltei ciente de que, ao menos, tinha diminuído as horas.

 

Ao chegar ao apartamento, Rita estava mais louca que nunca. Fazia piadas que as amigas não riam, ria descontroladamente, as outras se entreolhavam, começou a ofender as demais pensando que soava engraçada. Resumindo, uma grande cena de vergonha e idiotice. Entrei, ela me beijou, agradeceu e já correu junto a uma de suas amigas pra preparar o drink. Antecipei-me dizendo que não queria aquilo e peguei mais uma garrafa de cerveja. Fiquei na sala. As horas passavam e nada mais acontecia. A cada minuto, eu percebia que eu não era o único de saco cheio e que as outras meninas já se preocupavam com Rita. Ela cambaleava pra lá e pra cá e eu já previa trabalho e problemas. Foi questão de esperar o drink acabar pra eu falar que era hora de irmos e, então, ouvir uma série de ofensas em tom de embriaguez. Não dei importância, despedi-me de todos e forcei que ela fizesse o mesmo. Durante o caminho ao carro, ouvi resmungos incessantes e alguns soluços e arrotos. “Foda-se! Acabou!”, pensei. Mais uma vez, pensei errado.

 

Já no carro, voltávamos e tudo estava tranquilo, até que Rita resolveu ligar o som. Tocava “Shout”, do Tears For Fears, e ela adorava ouvir isso, se excitava. Foi a deixa. Ela começou a se tocar e dançar, amarrada ao cinto de segurança. Irritada, soltou o cinto. Estávamos, a essa altura, em uma via expressa. Deixei que se divertisse. Quando, de repente, me atentei e percebi que ela estava ficando nua, no banco da frente, deitado. Não somente estava se masturbando, como começou a me tocar também. Pedi para que parasse, a fim de evitar algum acidente, mas ela não deu ouvidos e continuou. Acabei cedendo e permitindo que ela se soltasse completamente, e, excitado, resolvi arriscar terminar o que ela havia começado: a masturbei até que gozasse (dirigindo, ainda). Pensei que isso cessaria ou, ao menos, interromperia seu fogo por um tempo. Pensei errado, pela terceira vez, no mesmo dia. Não bastou e, alucinadamente, ela começou, com o carro em movimento, a abrir a porta. Dizia que tinha de descer, que ia ficar por ali mesmo (no meio do nada). Dizia que eu poderia ir pra casa, ela não iria. Puta que pariu! Onde, ou melhor, com quem eu fui me meter?

 

Até que, enfim, chegamos à sua casa. Um condomínio de prédios. Ela morava com a mãe. Ao chegar lá, sua mãe viu seu estado: insana e completamente bêbada. A briga das duas começou. Eram como cão e gato, ambas. Loucas e derrotadas pela amargura de frustrações que uma carregava sobre a outra. Não se davam bem de modo algum. Sorrisos e abraços por ali era fachada e duravam menos de cinco minutos até a próxima briga. Uma série de ofensas. Os vizinhos ouviam tudo. O vizinho de cima batia no chão com força, o de baixo batia no teto com algum cabo de vassoura ou algo do gênero. Puta que pariu! Eu, com dor de cabeça por conta do excesso de cerveja e falta de paciência, assistia à desgraça e me via num capítulo trágico de algum filme alternativo de universitário. Prevendo merda maior, peguei Rita pelo braço, “vamos embora!”. Cheguei a sua mãe, interrompi seu discurso carregado de ódio e rancor, senti gotas de saliva que voavam de sua boca caírem em meus braços e falei: “escute! Chega! Cansei. Vou levá-la daqui. Amanhã, vocês se resolvam. Quero um pouco de paz, e vocês não estão ajudando em nada.” Se for pra errar, que seja com classe. Errei de novo. Chamei a responsabilidade. Assumi a bucha. Que imbecil!

 

Levei Rita ao carro e afivelei o cinto. Saindo dali, ela solta o cinto e abre a porta. Novamente, carro em movimento. Filha da puta! Parei, puxei-a pra dentro e a prendi novamente. “Escuta, porra! Você vai me obedecer, caralho! Fique quieta nessa merda.” E parti rumo ao motel mais próximo. Um pulgueiro nojento e velho, mas era o que eu podia pagar. A porra do licor custou-me o olho da cara e eu não estava mais a fim de gastar um puto com ela, já era muito aquilo.

 

No quarto do motel, ela começou a chorar. Rita tinha disso. Era compulsiva com a bebida, com o sexo e também com as lágrimas. Quando começava, a desgraça se amplificava e se eternizava em sua mente. Ela chorava como se tivesse perdido um filho ou algo assim. Sentei-me a seu lado e tentei consolá-la. Ora, mas que merda! Ir a um motel pra ficar consolando a pessoa? Mas paciência era uma virtude que me aflorava sempre em situações extremas, mesmo que minutos antes tudo que eu quisesse era matar alguém. Então, após muitos lamentos, Rita se levantou e foi ao banheiro. Começou a vomitar. Fui até lá socorrê-la. Ajudei a se levantar e voltei pro quarto. Deitei-me. Era o melhor a fazer mesmo.

 

Alguns minutos depois, lá estava ela, nua, encostada na parede do corredor entre o banheiro e o quarto, me olhando, com seu olhar ninfomaníaco e sedento. Fiquei sem entender por um tempo e não reagi. Ela veio até mim e me arrancou a roupa. Fodemos violentamente e então pensei que ela dormiria. Não. Ela ficou olhando na direção do teto, sentou-se, coçou a cabeça, foi ao banheiro, e começou a praguejar. Perdera um de seus brincos. Como diabos alguém lembra que tem brincos e, ainda por cima, percebe que perdeu um deles no estado em que ela estava? Fiquei na minha. Ela xingava a Deus e ao mundo, a mim inclusive, e eu permanecia deitado. Passados mais alguns minutos, ela voltou ao quarto e, mais uma vez, parou ao lado da cama, recostada na parede, me encarando. Eu já não sabia mais o que pensar. Ela não era sensual, ela não era escultural, ela não era atraente. Não que eu fosse atraente também, mas o que teria me atraído nela, nessa hora, eu procurei saber e não fiz ideia do que teria sido.

 

Ela voou pra cama e começou a me chupar. Meu deus! Eu temi. Algo me dizia que essa teria sido a última vez que eu utilizaria meu camarada. “Ela vai morder! Ela vai arrancar fora, essa porra!”, era tudo o que eu conseguia pensar. Então, ela subiu em mim e cavalgou, novamente. Foder era tudo que ela sabia fazer, especialmente bêbada, sem me insultar. Ofender-me já estava virando rotina. E quando as ofensas começam, o respeito dá lugar ao desprezo. E o desprezo é pior que a raiva e o ódio. De qualquer modo, ela ainda fodia bem o bastante pra eu continuar por ali. E apesar de tudo, ao menos, eu tinha alguma fé de que ela se cansaria depois dessa segunda vez. Ao menos, esse era o meu plano!

 

Mas não é óbvio? Ela não se cansou. Mais uma vez, após a transa, se jogou do lado da cama e ficou reclamando, resmungando, amaldiçoando todos os seres sobre a Terra. Eu fui até o banheiro e a deixei ali. Quando voltei, ela estava nua tentando abrir a porta do quarto. Perguntei: “porra, que diabos você está tentando fazer?”. “Vou embora dessa merda!”, me respondeu. Porra, o que ela havia usado enquanto eu dormia ou buscava o licor? Não sabia que ela era tão louca assim, afinal de contas, já havia passado tempo o bastante pra que todo aquele álcool sossegasse em seu sangue. Escondi as chaves do quarto antes que uma merda acontecesse. Então, deitei mais uma vez à espera do sono que acabaria com essa noite. Ou madrugada. Eu já havia perdido a noção do tempo.

 

Quando estava apagando, senti suas mãos frias tocando meu saco. Puta susto! Rita estava lá, se distraindo novamente. Queria foder. De novo. Incansável, insana, insaciável, ensandecida. O que se espera disso? Não se sabe o que esperar, na verdade. Hora ou outra, ou serei castrado, ou terei um infarto. Quando menos esperava, ela me puxou pra cima dela e penetrou meu pau. Puxava-me com força. Descontrolada, em chamas. E gemia, gritava, rugia! Então, começou a me pedir pra bater em seu rosto. Pedia-me tapas. E a cada tapa, pedia que fosse mais forte. E mais forte. Então, de repente, PAF!. Puta tapa na minha cara. Desgraçada louca! Seus olhos cheios de ódio. Sua boca entreaberta com os dentes cerrados me dizia algo, como se quisesse me matar. Quis estrangulá-la na hora. Não fiz isso, mas como eu quis! E, então, ela bradou: “você pensa que sou idiota? Vou apanhar quieta? Seu filho d’uma puta! Nem fodendo!”. Fiquei sem reação. Broxei, na hora, e isso foi tudo.

 

Não entendi mais nada. Ela era louca, definitivamente louca. Eu estava transando num hospício, só podia ser. Alguma coisa estava muito errada e eu não poderia prorrogar aquilo. Saí de cima dela sem maiores explicações. Ela começou a me perguntar o que tinha acontecido. Deixei falar e falar. Pra mim, já não tinha mais o que conversar com ela, fazer, perguntar ou responder. Fiquei sentado na cama, olhando pra tevê do motel, desligada. Ela se deitou ao meu lado e apagou. Roubou-me toda a coberta, enrolou-se e caiu no chão. Continuou dormindo. Pensei em levantá-la e colocá-la na cama, mas não havia por quê. Deitei e dormi. Na manhã seguinte, levei-a embora.

 

Daí para o fim, apenas mais algumas ofensas. E também algumas fodas, muitas garrafas esvaziadas, lágrimas e cinzas de cigarro derrubadas, fugas de blitz policiais, discussões sem propósito além de arrumar assunto e algumas últimas trocas de o que restava de carinho. Ou seja, aquela rotina insana e cansativa. Mas, acima de tudo, nenhuma outra taça de Cosmopolitan. Ah, menos mal!

 

História pra contar.

 

E meu pau continua inteiro.

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