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Entre olhares e almas

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Não podia desviar o olhar. Como se este fosse o único ponto iluminado. Os sons da rua, as vozes alheias. Nada lhe chamava a atenção. E por que chamaria?
Tinha tudo ali, num olhar profundo e intenso, e se via hipnotizado, magnetizado pela força de um foco único e súbito, fatal. Nu diante de alguém tão íntimo quanto desconhecido. Não haveria segredos, ainda que tudo fosse fruto de um mistério que pairava no ar e lhe roubava a consciência. O que fazer?
Não sentia medo, não sentia frio, não sentia qualquer dúvida ou incerteza. Queria se render, se entregar. Submerso à mágica que o envolvia, via-se liberto de todo o mal que já lhe fora acometido outrora. Os pelos dos braços, arrepiados, lhe acusavam. Seu peito estava acelerado, suas pupilas dilatadas, sua pele fervia e a voz lhe saía rouca. Sentia uma conexão nunca antes experimentada. Inebriado, entorpecido, privado de refúgio, se envolvia a cada segundo mais e não desejava o contrário.
Palavras e sussurros o contagiavam, escurecendo tudo ao redor e criando um ambiente no qual apenas o que importava era o que via, ouvia e sentia.
Sim, era ela. Como uma vampira, lhe sugava as energias, mas deixava suas presas marcadas em seu corpo e sua imortalidade em sua alma; como uma bruxa, lhe enfeitiçava a mente, mas sem enganá-lo, e lhe alimentava com sua magia; como uma deusa, lhe roubava o coração, mas para dele cuidar e saciar as ansiedades.
Ela tinha detalhes que eram somente seus. O sorriso, sincero e singelo. Seus traços, delicados e finos. Sua voz, doce e limpa. Suas mãos, pequenas e suaves, de sutis e gostosos toques. Seu perfume, que alimentava sua imaginação e lhe provocava sensações e sabores deliciosos. Mas nada era tão único, profundo e potente quanto seu olhar. Ela tinha a verdade revelada e a alma exposta em seu olhar transparente e brilhante. Ela se entregava sem esperar que ele o fizesse. Mas era inevitável, ele haveria de perceber o mundo que estava por conhecer, a beleza que estava por viver, a riqueza que estava por conquistar com ela.
O primeiro encontro de seus olhares, o maior encontro de suas almas. Do alto, tudo observei, em silêncio. A fraqueza do mortal ante a potência do ser eterno, talvez a ilustração mais justa deste homem, que vagava sem rumo e encontrara, por fim, um caminho para sua realização diante da força e segurança que ela lhe transmitia.
Cada detalhe, como o mais leve bater de asas de uma borboleta, provocaria as mais fortes rajadas de vento em seus dias. Não havia lar mais perfeito para seu amor que não fossem os braços, os seios e o coração desta mulher. E hoje, ele tão bem, enfim, o sabe.

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